SUSTENTABILIDADE, TRIMEMBRAÇÃO E REDES

algumas questões críticas no relacionamento de iniciativas sociais com financiadores
 – e o caso específico das instituições apoiadas pela Associação Beneficente Tobias

Este material foi produzido pela Associação TRÓPIS (www.tropis.org) para trabalho em um círculo limitado: instituições que recebem apoio da Associação Beneficente Tobias (ABT), a própria ABT, consultores envolvidos no trabalho de comunicação entre elas.

Havendo verificando que seu interesse ultrapassa o horizonte dessas relações interinstitucionais específicas, o disponibilizamos aqui DE FORMA PROVISÓRIA -
isto é: o material será ADAPTADO em breve para uso geral, retirando as referências excessivamente específicas às relações entre ABT e suas apoiadas, e esclarecendo pontos que podem parecer obscuros a quem não conhece os conceitos gerais da Trimembração Social. (Nesse sentido remetemos desde já a outros materiais
sobre o assunto que também se encontram em www.tropis.org/biblioteca ).

No momento em que a Associação Beneficente Tobias (ABT) convida à roda de conversação as diversas iniciativas que recebem seu apoio, a Associação Trópis (que é uma dessas iniciativas), sente-se no dever de compartilhar com esse círculo alguns elementos da análise, sobre esse tipo de relação, que vem desenvolvendo e sustentando como posição pública há vários anos – isso tanto pelos efeitos sempre salutares da transparência quanto na esperança de que esses elementos possam ser úteis, de uma ou de outra forma, nas nossas buscas conjuntas.

1. Autossustentação e Trimembração Social. Tornou-se usual, entre organismos que financiam ou dão apoio a iniciativas da sociedade civil, declarar que sua política é ajudá-las a chegarem a um ponto em que possam “andar com as próprias pernas”.

Sem dúvida é um pensamento justificável do ponto de vista da Administração convencional – que é na verdade uma extensão do pensamento do setor econômico para os demais setores da sociedade: cada iniciativa é vista aí como um pequeno empreendimento (= empresa), que naturalmente deve conquistar sua eficiência econômica o mais rápido possível.

Seu aspecto de racionalidade é tão grande, aliás, que parece ter se tornado um dogma inquestionável e onipresente – em tal medida que o vemos mencionado com freqüência em conjunto com as idéias da Trimembração Social – o referencial de análise e organização proposto por Rudolf Steiner.

O que sugere, lamentavelmente, que o espírito da Trimembração Social não venha sendo tomado completamente a sério, pois de acordo com ele a proposta da autossustentabilidade se mostra inadequada para grande parte das iniciativas sociais da sociedade civil, provavelmente para a maioria.

Afinal, poucas perspectivas são tão fundamentais na Trimembração como a seguinte: está na natureza de certas atividades gerar um mais-valor econômico, enquanto está na natureza de outras que jamais venham a ser economicamente produtivas, sem que isso constitua uma deficiência – pois as atividades não devem ser vistas isoladamente e sim em sua inserção na sociedade como um todo integrado; e um tal olhar revelará imediatamente que o mais-valor de uma parte e o déficit econômico da outra se pertencem.

Como a sociedade deve fazer o encaminhamento dos recursos de um setor a outro, e isso sob condições ideais ou sob as condições presentes, pode tornar-se uma longa discussão teórica – a qual porém não faz diferença para os pontos em questão no momento.

Importa é relembrar que há iniciativas que jamais deverão tentar se sustentar, no sentido de serem economicamente produtivas ou mesmo não-deficitárias, pois se tentarem fazê-lo desviarão forças da sua verdadeira missão; e mais: tais iniciativas deverão ser não meramente “apoiadas” e sim perenemente sustentadas pelo setor economicamente produtivo, sem que haja erro nisso, enquanto a sociedade existir.

Um exemplo concreto para que não haja equívocos: uma iniciativa poderia consistir em ajudar determinada população carente a organizar uma oficina de produção de brinquedos. Sem falar das dificuldades do marketing num mundo de grandes corporações, o fundamental é que a renda gerada se destina ao auto-sustento da própria população, descontado no máximo o custo da administração do próprio negócio. Não cabe incluir aí o custo da atuação pedagógica da instituição – inclusive porque essa escala de atividade econômica nunca gera excedente suficiente para pagar uma atuação pedagógica de qualidade; e muito menos cabe a uma iniciativa pedagógica atuar como capitalista contratadora de mão-de-obra.

Admitimos que nas condições atuais pode ser inevitável o recurso pelo menos parcial ao caminho dito da sustentabilidade. Para evitar a diluição e descaracterização da Trimembração, é fundamental porém ter clareza de que se trata de outro caminho.

2. A Trimembração e o discurso do Terceiro Setor. Circulam hoje na sociedade diversas outras falas e propostas que também parecem ir na direção da Trimembração – p.ex. a promoção do conceito de Terceiro Setor e o crescimento da Captação de Recursos como atividade regular e sistematizada. Encontram-se aí porém diversos pontos de incongruentes ou mesmo traiçoeiros – os quais, como é no contexto atual que nossas iniciativas trabalham, terminam fazendo parte da nossa questão. Comentaremos alguns:

a) Como todos sabem, a política-padrão é apoiar projetos específicos, e não a manutenção regular das instituições; analogamente, considera-se que um orçamento é tanto mais saudável quanto mais pague materiais, e menos pague pessoas! É espantoso que essa atitude se mantenha inabalada como um verdadeiro princípio central, quando é fácil demonstrar sua profunda irracionalidade – a menos que ela vise intencionalmente impedir a formação de organizações de base, ou “de baixo para cima”!

    Nesse ponto é preciso louvar a solitária e frutífera atitude em contrário por parte da ABT: se o apoio a projetos fornece números vistosos mais rapidamente, o apoio a pessoas é que fornece resultados reais duradouros!

    (Esse fato pode ainda esclarecer por quê pequenas instituições como as nossas tendem a se tornar dependentes demais da ABT: apesar de algumas dificuldades na comunicação, tem sido apenas na ABT que encontramos como padrão esse procedimento racional que é o de apoiar as pessoas!).

b) O mesmo discurso propõe, para o Terceiro Setor, crescente profissionalização para as funções administrativas... e trabalho voluntário para as funções que são propriamente a razão-de-ser do setor. Ou seja: uma inversão de prioridades entre os meios e a finalidade.

    Trabalho pedagógico social sério não é passatempo; exige capacitação (seja formal ou informal), dedicação integral, e precisa ser remunerado dignamente. Quem tem recursos que lhe permitam trabalhar de graça deve doar esses recursos para possibilitar o trabalho pedagógico de quem se dedica integralmente ao campo; se além disso ainda quiser ajudar no trabalho, seja bem-vindo! (Quanto à profissionalização administrativa, ver ponto 3).

c) O serviço de captação vem se tornando ele mesmo uma atividade econômica – o que, entre outras conseqüências, começa a fazer parecer razoável a competição entre iniciativas de cooperação social! O espírito da Trimembração nos faria ver, porém: (1) longe de ser uma função orgânica em si, a captação é apenas metade de um processo cujo desmembramento acarreta prejuízo à saúde do organismo social: o de captação-e-distribuição; (2) seu único posicionamento saudável é como parte da Vida Contratual (Rechtsleben), e gerida de modo colegiado por representantes de todas as frentes e interesses envolvidos.

d) Há organizações de apoio que já se aproximaram bastante dos princípios da Trimembração, porém hoje as vemos assumir mais e mais o discurso da sustentabilidade. Na verdade não é de estranhar, pois a tentativa de aplicar de modo continuado os princípios da Trimembração não demora a evidenciar sua natureza fortemente distributiva – na contramão, portanto, da tendência geral e atual da sociedade, que é a de valorizar o acúmulo ou concentração.

    Veja-se p.ex. a organização Ashoka: declarava originalmente apoiar “inovadores sociais”; atualmente fala de “empreendedores sociais”. Paralelamente, ao divulgar suas atividades retirou a ênfase da canalização de recursos para idéias inovadoras julgadas por sua utilidade social propriamente dita, passando-a para a premiação (competitiva) da eficiência já demonstrada na captação e/ou geração de recursos. Em outras palavras: premiar modelos que, imitados, tornem desnecessário o primeiro tipo de apoio. Era porém justamente o primeiro tipo que se aproximava da Trimembração...

3. A miragem da eficientização administrativa - também “vendida” como Profissionalização do Terceiro Setor. Extremamente na moda, talvez por ter aberto novo campo de trabalho para consultores e administradores...

... propugna que a saída para a necessidade de financiamento está na gestão mais eficiente dos recursos existentes, bem como na captação executada com qualidade profissional.

Tal discurso pode ter seu lugar... porém em boa parte não é mais que desconversa frente à necessidade de distribuir os resultados da vida econômica – algo assim como: “continuaremos comendo as frutas e entregando as cascas, mas daremos cursos que mostram quanta coisa você pode fazer com cascas, se for um cozinheiro eficiente!”

Além disso, na prática termina atuando como um filtro que permite o florescimento de instituições de iniciativa das próprias classes empresariais (p.ex. institutos culturais de bancos), e faz morrer no nascedouro a pequena iniciativa propriamente social, nascida de baixo para cima – à qual caberia a importantíssima função (talvez indesejada...) de capilarizar as oportunidades de participação de todas as pessoas nos processos da sociedade.

Pois a pequena iniciativa social se vê logo de saída “crucificada” numa dupla impossibilidade:

a) É-lhe literalmente impossível atingir internamente o nível de profissionalidade que se tornou indispensável na frente contábil e de administração – a menos que para manter esses profissionais sejam sacrificados os trabalhos que são a razão de ser da instituição, tornando-a uma estrutura “eficiente” porém vazia, ou pelo menos rala de conteúdo.

b) É-lhe literalmente impossível atingir internamente o nível de profissionalidade que se tornou indispensável  na captação de recursos – a menos que... etc.

Não se trata, porém, de estudarmos como tornar possível essa profissionalização interna! Isso seria comparável a dizer que, já que o ônibus é o meio de transporte adequado a moradores de favela, cada barraco, além dos moradores e seus pertences, deveria abrigar um ônibus! Tal nível de profissionalidade administrativa simplesmente NÃO CABE em uma pequena organização sem violentá-la, e jamais caberá!

Mais: tampouco estão ao alcance dessa pequena iniciativa serviços externos de qualidade oferecidos por prestadores de natureza comercial, nessas duas áreas e na assessoria jurídica.

Só vemos um caminho para a sobrevivência da pequena iniciativa social neste contexto: a organização em redes e a contratação de serviços em conjunto.

4. Trimembração e Networking. De todos os passos dados pela humanidade no século XX, talvez o que traz em si o maior potencial de conseqüências para o futuro seja a compreensão das características e vantagens da organização-em-rede.

Ao contrário dos discursos-da-moda comentados antes, essa percepção desenvolvida gradualmente no último terço do século (isto é, desde perto de 1968) não é apenas compatível com o espírito da Trimembração Social, mas pode mesmo ser vista como um amadurecimento da humanidade indispensável à plena realização da Trimembração (não faz diferença se existem ou não referências a isso, explícitas ou implícitas, nos seus textos iniciais).

A organização em redes como caminho de sobrevivência-sem-descaracterização para iniciativas sociais já foi defendida por nós nos textos Algumas idéias sobre a Cooperação-em-Rede entre Instituições e Algumas Condições Vitais para a Cooperação segundo a experiência da Pedagogia do Convívio, divulgados em 01.11.2003 e disponíveis na internet em www.tropis.org/biblioteca .

Dois pontos devem ser mencionados aqui:

a) É relativamente fácil pensar em uma rede ou “cooperativa de contratação de serviços” para lidar com as frentes contábil, administrativo-burocrática e jurídica. Já trabalhar em conjunto no campo da Captação de Recursos cobra um aprofundamento ético radical, bastante além do que as pessoas consideram suficiente hoje! Embora naturalmente nunca ninguém vá admiti-lo, na prática esse parece ser o elemento desencorajador. No entanto não seria preço alto frente aos benefícios que traria...

b) Contratar quem realize as formalidades administrativas não significa delegar a gestão, ou o poder de decisão (como no caso do poder equivocadamente concedido às administradoras de condomínios) – porém os administradores contratados terão automaticamente o poder em mãos a menos que as iniciativas contratantes criem uma “contraparte superior”, uma instância com caráter de círculo ou conselho na qual possam articular, no nível decisório, aquilo que for conveniente articular.

    Veríamos com isso surgir um eixo de gestão-e-administração como espaço próprio, sem violentar o espaço ou roubar forças seja da frente executora dos trabalhos não-lucrativos (vida espiritual), seja da frente geradora de recursos (vida econômica); sem mandar em nenhuma das duas e sim prestando-lhes serviços, entre eles o de ajudar a co-ordenar (harmonizar) suas atuações. (Que tal chamar a isso “Trimembração”?)


5. Uma central por iniciativa central: um modelo e seus problemas.
Dissemos que a organização conjunta de serviços de captação de recursos provavelmente constituirá um desafio.

Por outro lado, já há décadas têm existido na Europa agências inspiradas pelas idéias da Trimembração que se propuseram realizar vários tipos de canalização de recursos. Provavelmente a mais conhecida seja a Gemeinnützige Treuhandstelle, sediada na Alemanha, conhecida entre nós como “Banco de Bochum”.

Nos anos 80 ouvimos inúmeras palestras de representantes dessa organização, que geralmente apresentavam seu trabalho de modo simples: “fazemos a intermediação entre pessoas que têm vontade de financiar iniciativas e as iniciativas que têm necessidade de financiamento”.

Deslumbrante! Nada mais que o óbvio e efetivamente necessário! Com o tempo, porém, identificamos pelo menos dois questionamentos a colocar diante desse modelo:

Caso Brasil: uma instituição que funcionasse assim, com esse caráter de intermediação e inspirada na Trimembração, ainda não aconteceu no Brasil. Quem sabe houve momentos com esse caráter, porém sem continuidade.

    É importante observar, inclusive, que houve momentos em que a própria ABT declarou sua intenção de tornar-se isso (uma central de captação-e-distribuição com fontes diversificadas). Absolutamente não sabemos se deveria ou não deveria ter se tornado; o que sabemos é que por uma ou outra razão até hoje não se tornou.

    Voltando ao caso brasileiro geral, o modelo parece tão óbvio que seria importante investigar por quê não aconteceu aqui. A “afluência do ambiente” não é suficiente para ser canalizada assim? Há resistência cultural? A linguagem utilizada não foi adequada? Ou simplesmente não houve iniciativa especificamente para isso?

Quem decide? Tivemos a oportunidade de observar esta questão diretamente em um ano de relações pessoais com o Banco de Bochum (1990-91), inclusive com diversas visitas locais, bem como no convívio com outros financiados por ele:

    Pelo menos naquela época, decisões sobre o que financiar e o que não financiar – e mais: o que mostrar a potenciais financiadores e o que nem mostrar – eram com freqüência tomadas por indivíduos isolados de modo bastante arbitrário; ou mesmo que a decisão fosse grupal, era tomada por um corpo econômico-adminis­trativo sem conhecimento específico suficiente sobre o campo de atividades das iniciativas que estavam julgando (a palavra é essa). Projetos culturais e intelectuais muitas vezes eram rejeitados sem haverem sido compreendidos.

6. O centro como iniciativa comum dos pontos de um círculo. No caso acima talvez tenha havido falta de clareza de que essa não é uma atividade econômica (que produz valor), e sim da esfera dos encontros e acordos, a Rechtsleben.

A única forma saudável de geri-la hoje seria por um órgão colegiado com representantes de todas as três esferas sociais.

Mais: se nesse círculo podem e devem estar presentes estudiosos teóricos e consultores diversos, o fundamental é que aí se sentem juntos representantes efetivamente representativos tanto de cada uma das unidades produtivas geradoras de recursos   quanto de cada uma das instituições sociais concretamente envolvidas.

Apostemos ainda que uma vez isso fosse levado a sério pelos representantes da área econômica, com real interesse, e não mais como uma “imposto social” do qual se desvencilhar o mais rápido possível, em reuniões sempre insuficientes, sem jamais se darem o tempo de sentir toda a realidade do que estão apoiando!

Teríamos aí, enfim, uma organização de captação e distribuição de recursos que fosse ela mesma social em sua natureza.

Com apenas o pequeno milagre do interesse sério por parte dos homens de negócios (tenhamos fé!), não vemos por quê tal tipo de organização não pudesse servir no Brasil. Mas resta a questão: como iniciativa de quem?

A ciência antroposófica, “mãe” da trimembração, mostra que centros vivos (p.ex. o Sol) são resultado da atividade da periferia quando se direciona para um ponto comum.

Já deve estar claro que acreditamos que uma rede deveria tomar a iniciativa...

... que seria a de organizar instâncias centralizadas de administração e de captação-distribui­ção de recursos (quer como órgãos diferentes, quer como setores do mesmo órgão)...

... considerando parte da rede, com representação em sua instância deliberativa, cada uma das fontes de recursos e cada uma das entidades beneficiadas.

Estamos convictos de que uma organização assim seria a mais capaz (ou no mínimo a menos incapaz...) para enfrentar os múltiplos aspectos do desafio que é a nossa sobrevivência adequada.

7. Voltando o olhar para a ABT e seus comensais (nós!) Nossas entidades têm o privilégio de relacionar-se com uma fonte de recursos que já nasceu inspirada pela Trimembração. Fim dos problemas?

Com certeza ninguém de nós tem essa ilusão! Problemas sempre existem, e, se querendo ou não somos gestores, cabe-nos justamente tentar identificar com clareza quais são e onde estão.

Na relação com a ABT, cabe notar antes de mais nada: o fato de ela ter nascido da aplicação do pensamento trimembrado a uma iniciativa econômica (a Giroflex) não garante que a “nuvem de entidades apoiadas”, que se formou em torno dela, tenha se estruturado de modo inspirado pela Trimembração – aliás, nem que simplesmente tenha se estruturado, ponto.

Ao mesmo tempo, tem enormes conseqüências o fato de que no Brasil o eixo Giroflex‑ABT se encontra virtualmente isolado, solitário, no seu esforço de financiar iniciativas de um modo inspirado na Trimembração.

Ora, com certeza a Trimembração seria inviável se significasse “pendurar” cachos de iniciativas em uma unidade produtiva única!

Essa dependência excessiva só pode gerar uma instabilização gravitacional recíproca nada sábia do ponto de vista administrativo.

É “a vida econômica”, de modo mais genérico, quem precisaria sustentar as instituições!

É absolutamente indispensável, portanto, que as instituições diversifiquem suas fontes de recursos. Mas...

Ora!, é claro que todas as instituições aqui já tentam fazê-lo. Porém apostamos que não é só a nossa pequena instituição (Associação Trópis) que considera insatisfatórios os resultados desses esforços. Por quê? – Sugestões:

a) Em parte porque não temos no Brasil outra fonte, além da ABT, com que dialogar em termos de Trimembração.

b) Muito provavelmente também porque nossos esforços (em busca de outras fontes) não estão coordenados.

Quanto a este segundo ponto, pode-se responder imediatamente: “porém estamos coordenados com outras instituições, ligados a outras redes! Quem diz que receber apoio da ABT é característica comum suficiente para definir a formação de uma rede?”

Com certeza é uma objeção absolutamente pertinente – porém talvez fosse mais inteligente considerá-la não uma objeção e sim uma pergunta a ser encarada em conjunto e sem a pretensão de já sabermos a resposta: seria de interesse definir uma rede precisamente entre as iniciativas apoiadas pela ABT?

Parece-nos que poucas questões hoje poderiam ser tão pertinentes quanto essa, no nosso círculo!

8. Adiantando alguns pensamentos. Em favor  da idéia de que cabe a organização de uma rede justamente entre as iniciativas apoiadas pela ABT, poderíamos dizer:

   Se temos interesse não apenas nos recursos da ABT mas na própria Trimembração Social, então já temos toda uma área de contato e não apenas um ponto.

   Mesmo que cada uma das nossas iniciativas prefira cuidar do seu próprio networking para um lado diferente, sem preocupação de coordenar-se com outras co-apoiadas pela ABT... se estamos todas interessadas na Trimembração ou pelo menos no campo antroposófico em geral... provavelmente vamos acabar nos encontrando aí na frente de qualquer jeito, inclusive na hora de captar recursos, pois afinal não saímos para direções tão diferentes assim...

Porém sem dúvida cabe analisar com cuidado, e por muitos pontos de vista, quais seriam as possíveis vantagens de cada uma dessas opções (formar rede ou não formar rede).

Um último ponto que precisa ser mencionado desde já é: caso nós, iniciativas apoiadas pela ABT, optássemos por ser uma rede, como seria a relação rede-ABT? Qual seria o lugar da própria ABT: dentro ou ao lado da rede? E em qualquer um desses casos, de que forma, com que funções?

Naturalmente só a própria ABT pode responder por si!, porém podemos e devemos adiantar o seguinte pensamento:

Seria extremamente forçado imaginar a ABT assumindo as funções do órgão que descrevemos acima: esse órgão deveria ser resultado do trabalho conjunto da rede – enquanto a ABT é uma instituição que já tem toda uma história e cultura organizacional próprias (muito próxima na realidade, embora não na forma jurídica, de uma “Fundação Giroflex”). Para tornar-se o órgão de que falamos teria que alterar sua composição, forma de funcionamento, sistemas de decisão – tudo. Viraria outra coisa – e provavelmente iria terminar nos fazendo falta uma ABT!

Mais sentido parece fazer a imagem de uma ABT sentada junto com outras instituições financiadoras e receptoras nesse novo órgão, compartilhando não só seus recursos financeiros como também sua experiência – desonerando-se pouco a pouco da carga de ser a “financiadora antroposófica universal no Brasil”.

Além disso, não se chega a esse ponto da noite para o dia; construir conjuntamente e colocar em funcionamento toda uma nova forma de organizar-se e trabalhar, isso requer algum tempo, encontros com custos de deslocamento etc... E dificilmente, pelo menos por enquanto, esse processo poderia ser viabilizado... sem o tradicional apoio da ABT! Embora não a única, essa é uma forte razão pela qual esperamos que a ABT se interesse por esta proposta com profundidade.

Para terminar - ou começar! - há ainda um ponto prático em que a ABT poderia começar a socorrer desde já as iniciativas que recebem seu apoio, independente de quaisquer novas formas de organização: colocar à disposição delas um bom serviço de contabilidade e quem sabe também de assessoria jurídica – disponível a todas em caráter permanente, e sem a típica má-vontade, da parte dos profissionais, de quem diz que “está fazendo isso de favor”. Um tal benefício, distribuído entre todas as iniciativas (possivelmente a própria ABT entre elas) com certeza compensaria seu custo magnificamente. 

Para concluir:

Um pouco de sincronicidade: Estávamos quase concluindo este texto quando soou o aviso de mensagem de e-mail nova... Fomos olhar e era convite para um seminário chamado... "Redes, Alianças e Parcerias para o Desenvolvimento Comunitário"!!!

(Para quem se interessar, é em Águas de São Pedro de 24 a 26 de outubro, informações em http://www1.sp.senac.br/terceirosetor/seminario/indexbr.htm )

Um tributo pessoal

... Por mais ou menos 56 meses de apoio para trabalhar nos primórdios do movimento biodinâmico brasileiro (1982-83, 1987-90), registrado em carteira pela ABT...

... Por bem uns 20 meses de sobrevivência pessoal (entre 2001 e 2004) em troca de traduções de Rudolf Steiner, financiadas para a Sociedade Antroposófica no Brasil pela ABT...

... Por já 42 meses (2001-2004) participando do desenvolvimento cotidiano da nossa Pedagogia do Convívio, ajudando a Associação Trópis a existir...

... e apesar de tantos momentos de perplexidade por não ouvirmos resposta em tantas vezes que era preciso conversar...

... como não expressar nosso reconhecimento, cara amiga Associação Tobias?

Praia Grande, 29 de setembro de 2004

Ralf Rickli rr@tropis.org • coordenador da
Associação Trópis para o Desenvolvimento Cultural e Social

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